terça-feira, 1 de março de 2011

Sonetos de Florbela Espanca - Meus preferidos

AMAR!                                                                                          

Eu quero amar, amar perdidamente!                                                    

Amar só por amar: Aqui...além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...

Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:

É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi para cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada

Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder...pra me encontrar...

Florbela Espanca 

TARDE NO MAR

A tarde é de oiro rútilo: esbraseia.
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,

Pousa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue o seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia,
Desenha mãos sangrentas de assassino!

Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar...

E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas,
São as asas do sol, agonizantes...

Florbela Espanca 

EM BUSCA DO AMOR

O meu Destino disse-me a chorar:

"Pela estrada da Vida vai andando,
E, aos que vires passar, interrogando
Acerca do Amor, que hás-de encontrar."

Fui pela estrada a rir e a cantar

As contas do meu sonho desfiando...
E a noite e dia, à chuva e ao luar,
Fui sempre caminhando e perguntando...

Mesmo a um velho eu perguntei: "Velhinho,

Viste o Amor acaso em teu caminho?"
E o velho estremeceu... olhou...e riu...

Agora pela estrada, já cansados,

Voltam todos pra trás desanimados...
E eu paro a murmurar: "Ninguém o viu!..."

Florbela Espanca 

SAUDADES

Saudades! Sim...talvez... e porque não?...
Se o nosso sonho foi tão alto e forte
Que bem pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah! como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como o pão!

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais a saudade andasse presa a mim!

Florbela Espanca 

AMOR QUE MORRE

O nosso amor morreu...Quem o diria!

Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta
Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria...

E outro clarão, ao longe, já desponta!
Um engano que morre...e loga aponta
A luz doutra miragem fugidia...

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver

São precisos amores, pra morrer,
E são precisos sonhos pra partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso

Fazer do amor quie parte o claro riso
De outro amor imposível que há-de vir!

Florbela Espanca

Florbela Espanca nasceu em 1894 em Portugal. Suicidou-se em  1930 ingerindo uma dose excessiva de remédio. Deixou escrito que não havia mais gestos nem palavras novas.

Um comentário:

  1. Eu também gosto da Florbela Espanca! Todos os seus sonetos são nostálgicos e mostram solidão da escritora.

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