terça-feira, 12 de abril de 2016

Algumas Histórias e Frases de Monteiro Lobato

"Nada de imitar seja lá quem for. Temos de ser nós mesmos. 
Ser núcleo de cometa, não cauda. Puxar a fila, não seguir."




A natureza criou o tapete sem fim que recobre a terra. Dentro da pelagem deste tapete vivem todos os animais respeitosamente. Nenhum o estraga, nenhum o rói, exceto o homem.
– A vida, senhor Visconde, é um pisca-pisca. A gente nasce, isto é, começa a piscar. Quem pára de piscar chegou ao fim, morreu. Piscar é abrir e fechar os olhos – viver é isso. É um dorme e acorda, dorme e acorda, até que dorme e não acorda mais [...] 
A vida das gentes neste mundo, senhor Sabugo, é isso. Um rosário de piscados. Cada pisco é um dia. Pisca e mama, pisca e brinca, pisca e estuda, pisca e ama, pisca e cria filhos, pisca e geme os reumatismos, e por fim pisca pela última vez e morre. 
– E depois que morre?, perguntou o Visconde.
– Depois que morre, vira hipótese. É ou não é?

Animais e a Peste

Em certo ano terrível de peste entre os animais, o leão, mais apreensivo, consultou um macaco de barbas brancas.
- Esta peste é um castigo do céu – respondeu o macaco – e o remédio é aplacarmos a cólera divina sacrificando aos deuses um de nós.
- Qual? – perguntou o leão.
- O mais carregado de crimes.
O leão fechou os olhos, concentrou-se e, depois duma pausa, disse aos súditos reunidos em redor:
- Amigos! É fora de dúvida que quem deve sacrificar-se sou eu. Cometi grandes crimes, matei centenas de veados, devorei inúmeras ovelhas e até vários pastores. Ofereço-me, pois, para o acrifício necessário ao bem comum.
A raposa adiantou-se e disse:
- Acho conveniente ouvir a confissão das outras feras. Porque, para mim, nada do que Vossa Majestade alegou constitui crime. São coisas que até que honram o nosso virtuosíssimo rei Leão.
Grandes aplausos abafaram as últimas palavras da bajuladora e o leão foi posto de lado como impróprio para o sacrifício.
Apresentou-se em seguida o tigre e repete-se a cena. Acusa-se de mil crimes, mas a raposa mostra que também ele era um anjo de inocência.
E o mesmo aconteceu com todas as outras feras.
Nisto chega a vez do burro. Adianta-se o pobre animal e diz:
- A consciência só me acusa de haver comido uma folha de couve da horta do senhor vigário.
Os animais entreolharam-se. Era muito sério aquilo. A raposa toma a palavra:
- Eis amigos, o grande criminoso! Tão horrível o que ele nos conta, que é inútil prosseguirmos na investigação. A vítima a sacrificar-se aos deuses não pode ser outra porque não pode haver crime maior do que furtar a sacratíssima couve do senhor vigário.
Toda a bicharada concordou e o triste burro foi unanimamente eleito para o sacrifício.

Moral da Estória: 
Aos poderosos, tudo se desculpa…
Aos miseráveis, nada se perdoa.

A assembleia dos ratos

Um gato de nome Faro-Fino deu de fazer tal destroço na rataria duma casa velha que os sobreviventes, sem ânimo de sair das tocas, estavam a ponto de morrer de fome.
Tornando-se muito sério o caso, resolveram reunir-se em assembleia para o estudo da questão. Aguardaram para isso certa noite em que Faro-Fino andava aos mios pelo telhado, fazendo sonetos à lua.
– Acho — disse um deles — que o meio de nos defendermos de Faro-Fino é lhe atarmos um guizo ao pescoço. Assim que ele se aproxime, o guizo o denuncia e pomo-nos ao fresco a tempo.
Palmas e bravos saudaram a luminosa ideia. O projeto foi aprovado com delírio. Só votou contra, um rato casmurro, que pediu a palavra e disse — Está tudo muito direito. Mas quem vai amarrar o guizo no pescoço de Faro-Fino?
Silêncio geral. Um desculpou-se por não saber dar nó. Outro, porque não era tolo. Todos, porque não tinham coragem. E a assembleia dissolveu-se no meio de geral consternação.
Moral da estória: falar é fácil; fazer é que são elas.

Contra a força não a argumento

Trechos de Guimarães Rosa

"O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem, é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre no meio da tristeza! Só assim de repente, na horinha em que se quer, de propósito – por coragem. Será? Era o que eu às vezes achava. Ao clarear do dia. "




"Mire veja: 
o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando.
 Afinam e desafinam."



"O sertão é dentro da gente. E esse sertão não é feito apenas de aridez e provocação, mas também de veredas, de estações de alívio e beleza em meio à solidão."

Deus nos dá pessoas e coisas, 
para aprendermos a alegria...
Depois, retoma coisas e pessoas 
para ver se já somos capazes da alegria
sozinhos...
Essa... a alegria que ele quer


Todo caminho da gente é resvaloso.
Mas também, cair não prejudica demais - a gente levanta, a gente sobe, a gente volta!...
O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.


"Mãe, o que é que é o mar, Mãe?" Mar era longe, muito longe dali, espécie duma lagoa enorme, um mundo d´água sem fim, Mãe mesma nunca tinha avistado o mar, suspirava. "Pois, Mãe, então mar é o que a gente tem saudade?"

A gente carece de fingir às vezes que raiva tem, mas raiva mesma nunca se deve de tolerar ter. Porque, quando se curte raiva de alguém, é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a idéia e o sentir da gente; o que isso era falta de soberania, e farta bobice, e fato é.

As Três Perguntas ------- DA


O rei, buscando a certeza de tudo de tal modo que nunca falhasse, fez três perguntas aos
homens estudados:
1) Qual a hora certa de começar tudo?
2) Quais as pessoas certas a escutar e a quem evitar?
3) Qual a coisa mais importante a fazer?
Os homens estudados divergiram nas respostas.
O rei, então, foi até um eremita, conhecido em toda parte pela sua sabedoria.
O eremita estava cavando quando chegou o rei. Então, o rei fez-lhe as três perguntas. O
eremita cumprimentou-o, mas não lhe respondeu e continuou a cavar. Notando que o velho já
estava cansado, o rei se prontificou ajudá-lo. E o fez por um longo tempo.
Mais tarde, um homem que estava na floresta à espreita do rei para matá-lo, mas desistiu
por causa de sua demora, foi ferido pela guarda do rei. O rei perdoou-lhe e prometeu dar-lhe
assistência, tendo em troca sua eterna lealdade.
Após isso, o rei fez novamente as três perguntas ao eremita, que lhe respondeu dizendo
que “a hora mais importante foi quando estava cavando os canteiros (senão seria morto); e eu
fui o homem mais importante; e fazer o bem pra mim foi o seu assunto mais importante.
Depois, quando o homem correu na nossa direção, a hora mais importante foi quando você
estava atendendo-o, pois se você não tivesse cuidado dos ferimentos dele, ele teria morrido
sem fazer as pazes com você. Então, ele foi o homem mais importante, e o assunto mais
importante foi aquilo que você fez por ele. Então, lembre-se: existe apenas uma hora que é
importante – agora! É a hora mais importante porque é a única hora em que possuímos algum
poder.”

O ÚLTIMO CONSELHO DE UM SÁBIO



O discípulo de um filósofo foi procurar seu mestre que estava para morrer e perguntoulhe:
– Não terias mais alguma coisa a dizer a teu discípulo?
O sábio, então, abriu a boca e ordenou ao jovem que olhasse lá dentro.
– Vês minha língua? – perguntou.
– Claro – respondeu o discípulo.
– E os meus dentes, ainda existem perfeitos?
O discípulo replicou:
– Não...
– E sabes por que a língua sobrevive aos dentes? ... É porque é mole e flexível. Os dentes se acabam e caem primeiro porque são duros. Assim aprendeste tudo o que vale a pena aprender. Nada mais tenho a ensinar-te.

O Destino Está Em Suas Mãos - DA


Conta-se que certa vez um homem muito maldoso resolveu pregar uma peça em um
mestre, famoso por sua sabedoria. Preparou uma armadilha infalível, como somente os maus
podem conceber. Tomou um pássaro e o segurou entre as mãos, imaginando que iria até o
idoso e experiente mestre, formulando lhe a seguinte pergunta:
– Mestre, o passarinho que trago nas mãos está vivo ou morto?
Naturalmente, se o mestre respondesse que estava vivo, ele o esmagaria com as mãos,
mostrando o pequeno cadáver. Se a resposta fosse que o pássaro estava morto, ele abriria as
mãos, libertando-o e permitindo que voasse, ganhando as alturas. Qualquer que fosse a
resposta, ele incorreria em erro aos olhos de todos que assistissem à cena.
Assim pensou. Assim fez.
Quando vários discípulos se encontravam ao redor do venerando senhor, ele se
aproximou e formulou a pergunta fatal. O sábio olhou profundamente o homem nos olhos.
Parecia desejar examinar o mais escondido de sua alma, depois respondeu, calmo e seguro:
– O destino desse pássaro, meu filho, está em suas mãos.

O Sábio e o Jogo de Damas - DA



Num remoto vilarejo da Europa Oriental, num dos dias de Chanuka, um respeitado rabino entrou na casa de estudos, num momento em que não o esperavam, e encontrou seus discípulos jogando damas, quando deveriam estar estudando as leis sagradas, como era o costume naqueles tempos. Quando viram o mestre, ficaram confusos sem saber o que fazer. Pararam o jogo imediatamente. Um dos discípulos, envergonhado, tentou desculpar-se:
– Perdoe-nos, mestre. Apenas queríamos nos distrair um pouco!
O velho fez um gesto bondoso e perguntou:
– Vocês conhecem as regras do jogo de damas?
Como ninguém respondeu, ele mesmo tratou de responder:
– Vou lhes dizer quais são as regras: a primeira é que duas jogadas não podem ser feitas por sua vez; a segunda, que somente se pode mover para frente e não para trás; a terceira, que, quando se chega à última fila, você está livre para ir aonde quiser. Vocês estão aprendendo lições muito importantes sobre a nossa existência. Prossigam com o jogo, por favor, prossigam.